Com o apoio do projeto “Caminhos Para a Proteção” família afegã aposta na culinária para começar uma nova vida no Brasil

Mohammad Naser Sultani, 32 anos, e a esposa Zakia Hakimi, 30, levavam uma “vida bonita” na cidade de Cabul, capital do Afeganistão. Mohammad explica que uma vida bonita para um afegão é poder se reunir com a família nos finais de semana na casa dos parentes mais velhos para comer, conversar e estar juntos. “É da nossa cultura estar juntos, viver sozinho é difícil para nós”. Além dos fortes laços familiares, Mohammad e Zakia eram realizados em suas profissões. 

Ele trabalhava na área de finanças para o governo e organizações internacionais, e ela era ativista pelos direitos das mulheres e professora na educação infantil. Com a tomada do país pelo regime extremista islâmico Talibã, em 2021, a vida da família Sultani estava em risco. 

“Quando o governo mudou, fugimos para o Paquistão. Pessoas igual a mim, que trabalhavam com o governo e com os países estrangeiros, corriam risco de vida. Se ficássemos lá, iríamos morrer. Deixamos tudo, fugimos só com as roupas do corpo”, lembra Mohammad. 

No Paquistão, ele bateu na porta de embaixadas de vários países para pedir refúgio. Por meio de visto humanitário concedido a cidadãos do Afeganistão, o Brasil trouxe a esperança de dias melhores.

“O Brasil foi o primeiro a dar resposta positiva para nós. Quando todas as portas estão fechadas e uma se abre, você entra correndo para ver o que Deus escolheu para você”, diz Mohammad. Inicialmente, ele tentou a vida em São Paulo e Minas Gerais, até encontrar em Santa Catarina o apoio da Círculos de Hospitalidade, que conheceu por meio de indicação da Agência da ONU para Refugiados, ACNUR.

Zakia, Mohammad e a filha mais velha Alina, de 6 anos, com a calopsita Limonada.

Há seis meses, ele vive com a esposa, os dois filhos e os pais em um apartamento na cidade de Palhoça, município da Grande Florianópolis. Desde a chegada em Santa Catarina, a família Sultani tem recebido apoio da Círculos de Hospitalidade, através do projeto “Caminhos Para a Proteção”, nas áreas de moradia e acesso a direitos. A organização também convidou a família para participar do Festival Culturas Migrantes, realizado em novembro de 2023, no centro de Florianópolis, em parceria com a Agência da ONU para as Migrações, OIM Brasil. Durante o evento, a família afegã comercializou comidas típicas do país de origem e recebeu elogios dos clientes. A experiência na feira serviu de estímulo para iniciar um pequeno empreendimento na área gastronômica chamado “Sabor Afegão”.

Sharifa, Mohammad filho, Mohammad pai, Zakia e o pequeno Yusuf, 1 ano, no apartamento onde vivem em Palhoça, SC.

 

Almoço da família Sultani, com arroz com cenoura e uvas passas e berinjela com molho de iogurte.

 

Carrinho que está sendo preparado para o negócio familiar “Sabor Afegão”. (Arquivo pessoal)

Atualmente, a família Sultani participa de uma feira semanal da Avenida Beira Mar Norte, em Florianópolis, e está investindo em um carrinho de food truck para levar o “Sabor Agefão” a outros pontos da cidade. 

“Com o apoio da Círculos de Hospitalidade temos uma casa e estamos tentando arrumar nossa vida aqui. Lá no Afeganistão, eu ajudava mulheres a trabalhar, estudar e também gostava de ensinar crianças. Aqui, por não falar bem português, as coisas não são fáceis, mas vejo que as mulheres têm liberdade, essa é a maior diferença entre a mulher brasileira e a mulher afegã. No Afeganistão as mulheres não podem andar sozinhas, dirigir, exercer funções que homens exercem. Quando eu falar bem português quero voltar ao ativismo”, conta Zakia. Junto com a  sogra Sharifa, ela prepara as comidas do “Sabor Afegão”, que trazem influências da culinária persa, da Ásia Central, do Irã e da Índia, devido à proximidade e ligações culturais.

“Eu vi que essa era uma boa oportunidade para gente mostrar nossa cultura, nossa comida e ter uma renda para o nosso futuro. Estamos pensando em abrir um restaurante daqui a um ou dois anos”, conta Mohammad.

Mesmo com familiares refugiados em vários países, como Alemanha, Estados Unidos e Irã, os Sultani se reúnem por vídeo chamada todos os dias para conversar, manter os laços e, apesar de todos os desafios e da distância, construir outra vez uma vida bonita. 

 

Texto e fotos: Sansara Buriti

 

 

 

Me inscrever
Notificar por
guest
0 Comentários
Comentários em linha
Ver todos os comentários
Posts Recentes

Posts relacionados

Cynthia Orengo

Vice-presidente

Cynthia é gestora de pessoas e servidora do Ministério Público Federal. Trabalha com projetos que resgatam o princípio da dignidade da pessoa humana, por meio de ações de responsabilidade social e voluntariado. Foi parceira da Círculos de Hospitalidade em diversos projetos e ações, como o Pedal Humanitário, que idealizou junto com a Bruna Kadletz. Apaixonada  pelas causas humanitárias, acredita em um mundo sem muros e fronteiras. Na organização, trabalha com ações de acolhimento, proteção e integração de pessoas deslocadas.