A área para piquenique em frente ao parquinho do Jardim Botânico de Florianópolis foi o lugar escolhido para celebrar o último encontro de 2024 do InterAções, projeto que oferece oficinas criativas para mulheres migrantes.
Bolos, frutas, cafés e sucos estão dispostos em uma mesa longa de madeira. Em outra, o grupo se dedica à pintura de vasinhos de argila que mais tarde vão receber mudas de levístico, uma erva aromática que lembra o salsão.
Pinceladas de cores vibrantes vão transformando a aparência dos vasos enquanto as mulheres conversam de tudo – da possibilidade de chuva nas próximas horas até questões pessoais sobre família e trabalho. O jeito natural como interagem revela a intimidade existente entre elas.
Boa parte da turma veio de países como Venezuela, Colômbia e Argentina. Algumas das alunas estão desde o início do projeto criado em 2022, quando o centro de extensão universitária Pró-Comunidade, da Unicesusc, implementou em parceria com a Círculos de Hospitalidade um espaço semanal, dentro do Campus, para promover a integração de mulheres migrantes por meio de oficinas criativas.
A equipe é formada por professores voluntários e extensionistas do curso de Psicologia que coordenam as oficinas e incentivam a construção de redes de apoio entre as participantes. Desde então, elas já experimentaram variadas técnicas e materiais: modelagem em argila; macramê; costura de bolsas; criação de brincos e objetos decorativos. Alessandra Caropreso, da Círculos de Hospitalidade, também apoia semanalmente as atividades e conduz a oficina de pintura de mandalas em vidro.
Fora do espaço habitual da universidade, a confraternização no Jardim Botânico é uma celebração e ao mesmo tempo uma despedida para alguns extensionistas como João Leiria, que concluiu o curso de Psicologia e está se desligando do projeto.
“O Interações marcou muito minha formação como psicólogo. Quando entrei eu era uma pessoa e agora saio totalmente diferente. A migração se tornou algo muito presente na minha vida, pois toda semana eu estava no projeto. Pode parecer óbvio, mas é importante dizer que migrantes são pessoas, não objetos de estudo, são pessoas de carne e osso passando por diversas situações que talvez não sabemos como lidar, mas buscamos maneiras para fazer isso”, diz João, extensionista durante quase dois anos.
Em nome do grupo de mulheres migrantes, a designer venezuelana Gaudis Sosa entregou aos extensionistas um singelo agradecimento: cartões com colagem de fotos de momentos compartilhados pela turma ao longo do ano.
“Todo o projeto é maravilhoso porque a gente se sente como uma família. Temos um desafio que é continuar as oficinas incluindo a proposta de produzir peças que possam gerar renda extra. A ideia é continuar e se profissionalizar, ser independentes e seguir unidas”, conta Gaudis, que neste ano conduziu a oficina de produção de brincos.
Claudia Lazcano, psicóloga e coordenadora do Pró-Comunidade, também participou da confraternização de encerramento do ano. Cubana radicada em Florianópolis há quase dez anos, Claudia vê a criação de redes de apoio como facilitadora no processo de adaptação a um novo país.
“Encerro esse ano contente com o resultado que tivemos. Vê-las felizes mostra o que significa esse projeto para elas. O grupo não tem a intenção de ser puramente terapêutico, mas não deixa de ter um efeito terapêutico. Esses vínculos curam, então nosso objetivo é refazer essas redes, esses vínculos que os migrantes acabam perdendo. Buscamos criar de novo essa rede que pode ser de amigos, família, instituições”, explica a coordenadora.
Após homenagens e abraços, cada pessoa escreveu uma frase inspiradora em um papelzinho e o colocou junto com a muda de levístico no vaso que havia pintado. Os vasos foram trocados entre elas em um amigo secreto que incluiu as crianças – como é de costume, pois além das mães, o projeto InterAções integra os filhos das participantes em atividades lúdicas.
“O momento agora é de sentar, avaliar o que deu certo e onde podemos melhorar para o próximo ano. No início a gente orientava mais. Aos poucos elas começaram a propor atividades, depois começaram a compartilhar o que sabiam fazer e o que poderiam ensinar às outras. Nosso objetivo é criar autonomia, então o grupo funciona com uma mediação mínima nossa”, conclui Claudia, destacando o protagonismo das mulheres migrantes.
Texto e fotos: Sansara Buriti (Círculos de Hospitalidade)