A Círculos de Hospitalidade, por meio do Projeto Integra*, realizou no dia 17 de agosto uma roda de conversa online para esclarecer dúvidas de pessoas migrantes e refugiadas sobre pensão alimentícia, guarda, casamento, união estável e divórcio. A conversa contou com a mediação da coordenadora do Projeto Integra, Maria Beatriz Maia, e foi conduzida pela advogada convidada Isabela Lourenção, especialista em direito das famílias e das mulheres.
A conversa “Direito da Família: guarda, pensão e divórcio” faz parte do calendário de eventos online voltados para a promoção de orientações sobre legislação e acesso a direitos no Brasil.
Abaixo, compartilhamos um resumo dos principais temas abordados por Isabela Lourenção:
CASAMENTO
Como faço para me casar?
Os noivos deverão procurar o Registro Civil das Pessoas Naturais mais próximo da residência de qualquer um deles e dar início ao processo de habilitação. Nesse processo, vai se garantir que todas as exigências legais sejam atendidas. Caso os noivos sejam habilitados e caso não haja nenhum impedimento legal, a celebração do casamento será realizada
Quais são os documentos necessários?
– se for solteiro: certidão de nascimento original ou cópia autenticada;
– se for viúvo: certidão de casamento e certidão de óbito do cônjuge falecido;
– se for divorciado: certidão de casamento averbada;
– comprovante de residência;
– declaração de duas testemunhas que confirmem que os noivos não têm impedimento para se casarem.
Uma pessoa menor de 18 anos pode se casar?
Os menores de 18 anos, em regra, não podem se casar. Mas, os adolescentes entre 16 e 18 anos poderão se casar por meio de uma autorização de seus pais ou responsáveis.
O casal precisa morar sob o mesmo teto para serem casados?
Não. A forma com que a relação se dará depende somente da decisão do casal.
A esposa tem que incluir o sobrenome de seu marido?
Não, essa é uma escolha dela. Ainda, é possível que o marido, caso deseje, acrescente também o sobrenome de sua esposa.
O que é pacto antenupcial?
É um contrato feito antes do casamento e em que o casal escolhe o regime de bens de seu casamento.
Quais são os regimes de bens?
– comunhão universal de bens: todos os bens adquiridos antes e depois do casamento pertencem aos dois;
– comunhão parcial de bens: esse é o regime que é a regra no Brasil, e ele vigora sempre que o casal não escolhe expressamente outro regime. Nele, somente serão dos dois os bens e direitos adquiridos durante o casamento. Todos os bens adquiridos antes do casamento são somente do cônjuge que o adquiriu;
– separação convencional de bens: as partes escolhem esse regime e não há a partilha dos bens adquiridos antes ou durante o casamento;
– separação obrigatória de bens: são para aqueles casos em que a lei impõe;
– participação final nos aquestos: durante a união, cada cônjuge possui patrimônio próprio, e à época da dissolução do matrimônio, caberá a cada um a metade dos bens adquiridos pelo casal, a título oneroso, na constância do casamento.
UNIÃO ESTÁVEL
O que é união estável?
União estável é aquela relação duradoura, contínua, pública e com o objetivo de constituir família. Ou seja, é a união de duas pessoas que convivem entre si como se casadas fossem, mas que não realizaram a formalidade de um casamento.
O que o casamento e a união estável têm em comum?
Muitos acreditam que a união estável é uma forma de não possuir as obrigações formais e patrimoniais de um casamento, mas isso não acontece. A união
estável, assim como o casamento, gera uma série de direitos.
Eu tenho que registrar a minha união estável?
Para que uma união estável exista e produza efeitos jurídicos e patrimoniais não é preciso que ela seja registrada. Assim, caso duas pessoas vivam como se casados fossem sem a realização de qualquer registro dessa união, em caso de eventual término ou morte de um deles, valem os mesmos direitos. No entanto, para evitar conflitos futuros, é sempre indicado que essa formalização seja realizada.
“Nos separamos e nunca registramos a união estável. O que fazer?”
Caso essa união estável não seja registrada, é preciso reconhecer sua existência e determinar seu fim. Isso pode ser feito por meio de cartório, quando não há discussões sobre a existência da união e sobre a partilha dos bens e quando não há filhos menores de idade.
Havendo discussão ou filhos menores, isso é feito por meio de uma ação judicial que tem como objetivo identificar o período de convívio e quais os bens adquiridos e partilhar os bens.
Quais são os direitos de quem vive em uma união estável?
Ainda que a união estável e o casamento se diferenciem em alguns aspectos, com relação aos efeitos patrimoniais, as regras são praticamente as mesmas. Assim como em um casamento, a união estável confere direito à partilha de bens, à herança em caso de morte, pensão alimentícia, inclusão em planos de saúde ou seguro de vida, por exemplo.
DIVÓRCIO
Onde dar entrada em um divórcio?
O divórcio pode ser feito por meio de um acordo entre as partes ou em uma ação movida somente por um deles. Ele pode ser feito em cartório (caso haja acordo e não haja filhos menores) ou por meio de uma ação judicial. Em qualquer um dos casos, é necessário procurar um advogado ou a Defensoria Pública.
O que acontece com os filhos quando os pais se divorciam?
Quando os pais se separam, é preciso tomar uma série de decisões sobre a vida dos filhos. Por exemplo, deverá ter que decidir com quem esse filho irá morar, como se dará a convivência do genitor que não mora do o filho; qual a modalidade de guarda vai ser adotada e qual o valor de pensão alimentícia que será pago.
Quais são os documentos necessários para o divórcio?
A relação de documentos pode variar muito de caso a caso. Mas, em regra: certidão de casamento, certidão de nascimento dos filhos (se houver), cópias do RG e CPF dos cônjuges, documentos dos bens móveis e imóveis (como carros, motos, casas) adquiridos ao longo do casamento.
Meu parceiro fala que não vai me dar o divórcio. O que fazer?
Você não precisa da concordância do seu marido para se divorciar. Quando um não quer, o divórcio poderá ser decretado por meio de uma ação judicial.
Existe tempo mínimo de casado para poder se divorciar?
Não. O divórcio pode ser feito inclusive um dia depois do casamento.
PENSÃO ALIMENTÍCIA AOS FILHOS
A pensão alimentícia só inclui os gastos com a alimentação dos filhos?
O termo “pensão alimentícia” ou “alimentos” não diz respeito apenas aos gastos com comida de quem recebe. A pensão alimentícia deve custear não apenas a alimentação, mas também a moradia, transporte, saúde, educação, lazer e vestuário.
Somente menores de idade têm direito a pensão?
Não, além dos menores de idade, o dever de pagar a pensão deve continuar até os 24 anos de idade, ou até os filhos concluírem o Ensino Superior – o que vier antes.
As grávidas têm direito à pensão?
Sim, é possível requerer pensão às gestantes. Esse pagamento é destinado à mulher para que seja possível arcar com os gastos da gestação (como, por exemplo, com medicamentos, exames e enxoval). Após o nascimento da criança, essa pensão é convertida automaticamente ao filho.
Como pedir a pensão alimentícia?
Em regra, é necessário procurar um(a) advogado(a) ou a Defensoria Pública para fazer esse pedido na Justiça.
Quanto será o valor da pensão?
Essa resposta depende de vários fatores, quando falamos em pensão para filhos comuns o valor da pensão é calculado levando-se em conta três principais fatores:
1) as necessidades da criança;
2) as possibilidades financeiras dos genitores;
3) a proporcionalidade de rendimentos entre o pai e a mãe.
Quanto às necessidades da criança, a pensão deve ser o suficiente para cobrir ou ao menos ajudar no pagamento de suas despesas. Deste modo, o valor da pensão deve considerar o necessário para que os filhos cresçam de maneira saudável e com dignidade.
Como a pensão será paga?
Poderá ser paga em dinheiro ou então “in natura” (ocorre quando uma das pessoas paga as despesas diretamente às instituições responsáveis). Há possibilidade também de o pagamento da pensão alimentícia ser misto, ou seja, uma parte paga em espécie e outra “in natura”, pagando parte dos famosos boletos.
Desempregado precisa pagar pensão?
Sim. Mesmo desempregado ou tendo uma renda variável, a pensão continua sendo obrigatória e, neste caso, observará os patamares mínimos a permitir a subsistência tanto dos pais quanto dos filhos.
Como cobrar a pensão alimentícia atrasada ou que não foi paga?
Antes de mais nada, para poder cobrar a pensão é preciso que tenha havido um processo anterior que determinou o valor da pensão. A principal função desse documento é comprovar a obrigação do devedor de pagar mensalmente uma quantia certa, por isso, o acordo “de boca” não é recomendado.
Para cobrar a pensão não está sendo paga, é possível entrar com uma ação. Essa ação pode ser feita de duas formas: por meio da penhora de bens ou através de prisão civil do devedor. A pessoa poderá escolher a via que lhe seja mais eficaz.
O valor da pensão pode ser modificado?
Sim, desde que tenha existido uma mudança na vida de quem paga (exemplo: perder o emprego), ou de quem recebe (exemplo: gastos com despesas extras). Isso é feito por meio de uma ação chamada “revisional de alimentos”.
Até quando dura a obrigação de pagar pensão ao filho?
Independente da idade do filho, para colocar fim ao pagamento de pensão alimentícia, é necessário o ajuizamento de ação de exoneração de alimentos. Somente após essa ação é que ficará desobrigado a pagar a pensão.
Uma pessoa pode ir presa caso não pague pensão?
Sim, a prisão civil será de um a três meses e pode ser decretada pelo juiz se o devedor não apresentar justo motivo para não ter efetuado o pagamento da pensão.
GUARDA
Quais são os tipos de guarda?
As modalidades de guarda são, basicamente, a guarda unilateral e a guarda compartilhada.
O que é guarda compartilhada?
Guarda compartilhada é aquela em que ambos os genitores tomarão, em conjunto, as decisões sobre a vida do filho. Ou seja, os pais são igualmente responsáveis, cabendo aos dois a supervisão e o cuidado pelos filhos. A guarda é do pai e da mãe ao mesmo tempo.
No entanto, isso não quer dizer que o filho residirá metade do tempo com a mãe e a outra metade com o pai. Guarda compartilhada é a divisão de responsabilidade, não necessariamente a permanência de tempo com cada um dos genitores.
Como regra geral, a criança possui uma residência fixa com um dos pais – o chamado “lar de referência” – e convive com o outro em certos dias e horários, buscando sempre manter a relação afetiva e fazer com que a criança ou o adolescente sinta de forma menos brutal a separação de seus pais.
Qual a diferença da guarda unilateral?
Já na guarda unilateral, somente um dos pais é o responsável pelas decisões da vida do filho. O outro genitor conviverá com a criança e supervisionará as decisões tomadas pelo guardião. Essa modalidade de guarda é estabelecida sempre que, por alguma razão, a tomada de decisão conjunta não é viável ou quando um dos genitores abre mão de exercer a guarda. São casos de estipulação da guarda unilateral, por exemplo, quando há histórico de violência doméstica ou de qualquer ato que desabone a conduta de um dos pais.
E se os pais morarem em cidades diferentes?
Mesmo que os pais residam em cidades ou até mesmo Estados diferentes, a guarda compartilhada ainda assim pode ser adotada. Isso porque, por meio da tecnologia – como chamada de vídeos e mensagens, por exemplo – o genitor que reside longe poderá acompanhar o desenvolvimento do filho e participar de todas as decisões de sua vida.
Há pagamento de pensão alimentícia na guarda compartilhada?
Sim, há pagamento de pensão mesmo na guarda compartilhada. Existem gastos que independem da modalidade de guarda ou do tempo que a criança passará com cada um dos pais.
*O Projeto Integra é implementado pela Círculos de Hospitalidade de acordo com o termo de colaboração firmado com o Ministério da Justiça e Segurança Pública, Convênio 917921/2021, e realizado com o financiamento do Edital de Chamamento Público SENAJUS N° 01/2021.